As experiências que desejo relatar no frontispício desta obra pretendem reforçar a ideia subjacente em todos os capítulos, a saber, que a tortura, além de desumana, é o meio mais inadequado para nos levar a descobrir a verdade e chegar à paz.
Não há ninguém na Terra que consiga descrever a dor de quem viu um ente querido desaparecer atrás das grades da cadeia, sem mesmo poder adivinhar o que lhe aconteceu. O “desaparecido” transforma-se numa sombra que ao escurecer-se vai encobrindo a última luminosidade da existência terrena. O que mais me impressionou, ao longo dos anos de vigília contra a tortura, foi porém o seguinte: como se degradam os torturadores mesmos. Este livro, por sua própria natureza,
não pode dar resposta plena à questão. Advertia um general, aliás contrário a toda tortura: quem uma vez pratica a ação, transtorna-se diante do efeito da desmoralização infligida. Quem repete a tortura quatro ou mais vezes se bestializa, sente prazer físico e psíquico tamanho que é capaz de torturar até as pessoas mais delicadas da própria família. A imagem de Deus, estampada na pessoa humana, é sempre única. Só ela pode salvar e preservar a imagem do Brasil e do mundo.