O nome de Caetano W. Galindo é bastante conhecido dos leitores, seja por suas premiadas traduções (como o monumental Ulysses), seja pelas deliciosas reflexões sobre a língua portuguesa no já clássico Latim em pó (2022) e no recente Na ponta da língua (2025). Nas páginas de As cidades, Galindo apresenta uma outra face dessa sua profunda relação com a força das palavras.
Partindo da lição de “escrita não criativa”, que encontra literatura em outros textos e elementos já prontos por meio da colagem, do sample e até mesmo da cópia, Galindo passou pela lista dos 5571 municípios do Brasil colhendo nomes que lhe pareceram ter algo especial a dizer “sobre a história toda de um país e suas línguas”. E o resultado é um poema que vai, em ordem alfabética, de Abre Campo a Zortéa, levando o leitor para viajar por Axixá, Descanso, Icó, Mostardas, Piripiri, Sorriso e Tartarugalzinho, seguido de um ensaio precioso sobre o processo (re)criativo da plaquete.
Esse jogo de pescar palavras de um contexto para outro, segundo regras criadas (e também infringidas) pelo próprio poeta, revela “o que [se] articula de beleza em torno da simples ideia de olhar em volta e perceber que toda sorte de matéria verbal, quando exposta de maneira destacada, pode ser lida como poema. E deve”. Em cada palavra escolhida, paramos um pouquinho para respirar, repetir em voz alta, imaginar seus sentidos, sua geografia (humana, inclusive) e seu papel no universo que chamamos de “nós”.
Para Galindo, a escrita de As cidades vai além de criativa ou não criativa; é recriativa e também recreativa: “durante a concepção da exposição Fala, Falar, Falares, que Daniela Thomas e eu organizamos para o Museu da Língua Portuguesa [aberta à visitação até 14/9/2025], existia uma parede de dois metros por quatro que ia ficar sem nada escrito, e a Daniela me disse pra inventar alguma coisa. E tudo voltou à minha cabeça, e eu me diverti”. É impossível não se divertir com ele e voltar dessa viagem com os ouvidos mais atentos para cada palavra ao redor.